Livríssimo entrevista: Alexandra Lopes e André Mota

O Livríssimo entrevista os professores e escritores de literatura infantojuvenil Alexandra Lopes e André Mota, autores de Pensando no X da questão; Amigo não é para essas coisas e Comprei aquilo, deu nisso

Com histórias divertidas e ricamente ilustradas, os livros abordam questões comportamentais que influenciam a vida em sociedade, como a mentira, a amizade, o julgamento pela aparência e o consumismo. 

Confira o que os autores falaram para a gente!

Livríssimo entrevista

L: A série tem mais de vinte anos, mas continua abordando temáticas atuais e, recentemente, foi reeditada pela Editora do Brasil. O que acharam desta nova edição e das ilustrações de Weberson Santiago?

Alexandra Lopes

Alexandra: Estamos extremamente satisfeitos com a nova edição da série. A Editora do Brasil fez um excelente trabalho em atualizar a apresentação dos livros, a linguagem, a terminologia e também a identidade visual, sempre mantendo a essência e a relevância das histórias para o público atual.

Naquela época, não existia o termo fake news, mas tratamos de fofoca… O consumismo estava longe dos patamares atuais, mas já vislumbrávamos um problemão à frente e dedicamos um livro inteiro da série a esse assunto… E corrupção, tema principal dos últimos anos no Brasil, já era tema central num dos livros da série, em 1992! Olhando para isso, entendi a iniciativa da editora de atualizar a série e foi um prazer revisitá-la e reescrevê-la com o André. 

As ilustrações de Weberson Santiago são incríveis e agregam ainda mais valor aos livros, trazendo vida aos personagens e ajudando a envolver os leitores na narrativa. Além disso, tivemos o apoio de uma competentíssima equipe pedagógica e editorial da editora que sabia exatamente o que a nova geração de leitores gostaria de ver nos nossos livros. O processo todo de reedição foi sensacional!

André: A nova edição trouxe oxigênio novo, pois tanto as atualizações do texto, como o primoroso trabalho do Weberson nas ilustrações, com tanta diversidade, levaram os livros do início dos anos 1990 para 2022. Até a leitura ganhou maior fluidez.

L: Voltando no túnel do tempo… Como vocês se conheceram e tiveram a ideia de formar a parceria?

Alexandra: Eu conheci o André quando trabalhávamos como professores em uma escola em São Paulo. Na época, eu lecionava Língua Portuguesa para turmas até a 4ª série do Ensino Fundamental, enquanto o André ensinava História para as classes posteriores. Como os professores das 4ªs séries faziam a transição dos alunos para os professores de matérias diferenciadas, tínhamos um contato próximo e conhecíamos todos os alunos daquela faixa etária, suas dúvidas e características individuais.

Durante esse período, percebemos a importância de abordar questões relevantes para os jovens e a influência positiva que a literatura poderia ter em suas vidas. Foi a partir dessa percepção e do nosso interesse em criar histórias que pudessem ajudar os adolescentes a refletir sobre suas experiências e desenvolvimento pessoal que surgiu a ideia de formar uma parceria para escrever a série de livros.

Acreditamos que a combinação das nossas habilidades e paixões seria uma base sólida para criar obras que cativem e ajudem os jovens em sua jornada de crescimento. Sem contar que cada personagem nasceu com características de nossos alunos reais… Sim, sabemos quem são todos os personagens de nossos livros… (risadas)

André: Éramos jovens professores de 20 anos, numa escola muito especial. Eu dava aula para o Ensino Fundamental II e Alexandra no Ensino Fundalmental I. Conversávamos sobre a falta de um livro que trouxesse a importância da reflexão sobre o conhecimento. Daí nasceu a parceria. Escrevemos juntos o Pensando no X da questão e batemos de porta em porta das editoras até encontrar a Editora do Brasil.

L: Como surgiu a série, após escrever o primeiro livro vocês tiveram ideias para os próximos ou esse já era o plano inicial?

Alexandra: Inicialmente, tínhamos o plano de escrever um livro, mas, à medida que mergulhamos no processo criativo, desenvolvemos muitas outras ideias e histórias para explorar.

Nossa “madrinha”, por assim dizer, foi a Coordenadora Geral da escola, na ocasião, a pedagoga e escritora Leila Rentroia Iannone, que já publicava pela Editora do Brasil e sugeriu que enviássemos para eles os originais para apreciação. Com o lançamento do primeiro livro da série, Pensando no X da questão, a própria editora sugeriu uma coleção. 

Assim, decidimos transformar o projeto em uma série: cada livro aborda uma temática específica, mas todos se conectam por meio dos personagens e do universo que criamos.

André: O então diretor, o sr. Walter, depois de irmos várias vezes falar com ele, nos atendeu. Leu a primeira história, adorou e nos pediu mais dois volumes, além da ideia de atividades para professores e alunos. Alexandra e eu ficamos meses trabalhando e nasceram Comprei aquilo, deu nisso e Amigo não é para essas coisas. Foi genial!

L: Como é ver seu trabalho atravessando décadas e ainda ser lido, relido e prestigiado? Vocês conhecem pais que leram algum dos títulos na infância e o recomendaram aos seus filhos?

Alexandra: É uma sensação maravilhosa e gratificante ver nosso trabalho continuando a cativar e ajudar os jovens mesmo depois de tantos anos. Saber que pais que leram nossos livros na infância agora os recomendam a seus filhos é realmente emocionante. Recebemos mensagens de leitores de diferentes gerações, o que nos motiva a continuar criando histórias relevantes que toquem a vida das pessoas.

André: Quase 30 anos depois, no próximo ano, festejamos esse aniversário, saber que crianças e adolescentes continuam a nos ler e mais, se sentindo atraídos pelas histórias e atividades, é muito emocionante e gratificante para nós professores. Num país tão carente de leitura, é muito relevante mesmo. Conheci alguns pais que leram e deram aos filhos. Também recebi imagens dos livros em diversas partes do país. Tudo muito surpreendente. 

L: As três obras possuem questões comportamentais interessantes para o desenvolvimento dos adolescentes, trazendo um viés reflexivo.

Alexandra, sua formação acadêmica integra Letras e Psicanálise. Poderia falar mais sobre seus estudos da técnica de Literapia? Isso influenciou a produção da série?

Alexandra: Na época da primeira edição, minha formação restringia-se ao Técnico de Magistério, à Faculdade de Pedagogia e aos 4 anos da Faculdade de Direito, que abandonei, sem concluir, enquanto escrevia a série com André.

Fui cursar Letras alguns anos depois, por já ter definido que minha vida seria dedicada à produção de textos, à educação e à pesquisa. Em seguida, veio a formação em Psicanálise e os cursos de pós-graduação em Neuropsicopedagogia, Psicopedagogia e ABA. 

Todo esse caminho tinha – e tem – como objetivo não apenas dominar a linguagem e a comunicação, mas entender profundamente como os leitores pensam, nas dimensões cognitivas e emocionais. Numa fase de pesquisa, em 2008, desenvolvi com a psicanalista Iara Bichara a Literapia, uma abordagem terapêutica que utiliza a leitura e a escrita como ferramentas de reflexão e autoconhecimento, baseando-se em Psicanálise.

Hoje, continuo na área de pesquisa, educação e produção de texto, mas mais especificamente com inteligência e Terceira Idade. Estou numa jornada – quase que numa cruzada! – para fazer com que filhos adultos e pais idosos se entendam e melhorem seus relacionamentos. Só mudei a idade dos leitores, mas praticamente são os mesmos, de 30 anos. 

Se eu queria ter essa bagagem toda quando escrevemos a série? Acho que ela não teria sido original e espontânea como acabou sendo, nascendo da nossa observação, convivência com adolescentes e prática, e não de teorias que só conheci depois.

André, além de historiador, você tem pesquisas e trabalhos voltados à área da medicina. Isso influenciou a série de livros? Podemos dizer que os títulos, além de comportamento, abordam saúde mental?

André: Quando escrevi era jovem, ainda estudava história na Universidade de São Paulo. Não sabia que viraria um especialista em história da medicina e saúde pública. No entanto, a coletânea acaba indo numa boa direção, ao tratar de assuntos que podem deixar os leitores e leitoras mais tranquilos diante da vida e de seus percalços. Essa é uma das grandes intenções de nossa coleção. 

L: Os dois autores são professores, tendo contato com muitos jovens. O que faz os livros captarem a atenção deste público e prendê-lo na leitura?

Alexandra: Acredito que os livros cativam os jovens por abordarem temas relevantes para eles e apresentarem personagens engraçados e exagerados, com os quais podem se identificar. Nosso objetivo era criar histórias envolventes, com narrativas dinâmicas e diálogos autênticos. Exploramos questões que fazem parte do universo dos adolescentes, como suas dúvidas, desafios e anseios, permitindo que se sintam compreendidos e encontrem respostas para suas próprias vivências.

Ao estimular a empatia e promover a reflexão, acreditamos que conquistamos a atenção dos jovens e os envolvemos na leitura. Esses elementos são essenciais para despertar o interesse e aprofundar o engajamento com os livros. E o interessante é que esses aspectos se mostraram atemporais ao longo dos anos.

Apesar de a coleção ter 30 anos, a nova edição, atualizada, manteve a essência dos livros. As mudanças realizadas foram principalmente relacionadas ao vocabulário, termos e circunstâncias para refletir a realidade atual dos jovens. No entanto, o que é realmente importante para a adolescência e para a formação integral de um ser humano permaneceu intacto. 

Acreditamos na importância de abordar questões estruturais que permeiam a vida dos jovens, e essa visão se mantém presente na série mesmo ao longo do tempo.

André: Bem, os temas continuam sendo muito atuais. Alexandra diz algo fundamental e eu concordo: é uma obra aberta, ou seja, sem moralismos ou definições impostas. São livros para pensar e discutir sobre a diversidade de pensamentos, de olhares e ações.

Num mundo atual onde pensar está subjugado a intolerâncias e moralismos, insistir na pluralidade se faz necessário. Nossos leitores concordam conosco, porque se sentem acolhidos em ser como são, pensar como pensam, sem medo de errar ou ter de refazer percursos trilhados. Eles entendem que a felicidade está naquilo que também é diferente dele e mais, sua compreensão do mundo deve ser valorizada.

Para concluir…

L: Vocês têm alguma recomendação aos jovens de hoje em dia?

Alexandra: Depois de um longo abraço, eu diria: 

Queridos jovens de hoje, minha recomendação é simples: sejam autênticos, corajosos e acreditem em si. Busquem o equilíbrio emocional, cuidem da saúde mental desde cedo e cultivem relacionamentos saudáveis.

Leiam, explorem diferentes perspectivas e busquem o conhecimento. Lembrem-se de que cada desafio é uma oportunidade de crescimento pessoal. Vocês são capazes de moldar seu próprio futuro. Tenham paixão, curiosidade e nunca deixem de sonhar. O mundo está cheio de possibilidades esperando por vocês!

André: Minha recomendação é que leiam sempre, pois a leitura nos leva a mundos distantes, pessoas nunca vistas, culturas que não são as nossas. Mais que isso, reforça a ideia de que somos diferentes e é na diferença que crescemos juntos. A leitura nos ensina a querer um mundo melhor, sem fome e sem miséria, sem racismo ou qualquer forma de discriminação. A leitura nos faz gente que gosta de gente. 

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