Livríssimo entrevista: Alexandre de Castro Gomes

Livríssimo entrevista: Alexandre de Castro Gomes

Em março, o Livríssimo entrevista Alexandre de Castro Gomes, que, além de ser autor de livros infantojuvenis, é professor de história da literatura infantil e juvenil brasileira.

Alexandre já ganhou diversos prêmios e reconhecimentos por suas obras. Pela Editora do Brasil, o livro “Encontros folclóricos de Benito Folgaça” entrou para o Acervo Básico FNLIJ em 2016 e “Origens” recebeu os selos Seleção Cátedra 10 em 2019 e Altamente Recomendável pela FNLIJ em 2020. Enquanto isso, “Eu sou uma lagartixa” é um queridinho do público e já vendeu mais de 23 mil cópias.

Confira o que ele falou para a gente!

Livríssimo entrevista

Livríssimo: Como foi trabalhar ao lado de outros autores no livro de contos “Origens”? O conto escrito por você fala de uma família portuguesa e é dedicado aos seus avós, como foi sua concepção? Seu enredo é biográfico ou fictício?

ORIGENS

Alexandre: Foi muito bom! Eu já queria homenagear meus avós há muito tempo, mas fiquei adiando até achar a fórmula que me agradasse.

Eu sabia que não queria criar um livro infantil, para os pequenos. Queria falar com os jovens, falar sobre famílias que passam perrengues. Queria que eles se interessassem em conhecer as histórias de suas próprias famílias enquanto os velhos ainda estão vivos. Somos múltiplos e pouquíssimos têm família de margarina, se é que alguém tem.

Resolvi contar a história que eu conhecia, que me contaram. Não é uma história inteira, até porque meus pais eram mais velhos do que a média e separados desde que eu era muito pequeno. Quando comecei a me interessar por essa história da família, meu pai já havia nos deixado. As poucas informações que consegui daquele lado foi com uma tia e por alguns documentos e fotos. Eu conhecia fragmentos e só.

Fui preenchendo os espaços entre esses fragmentos com invencionices. Por exemplo: meus avós paternos não vieram fugidos, mas eu achei que assim ficava mais interessante e pus lá. O resultado me agradou. Construí um enredo que é biográfico e fictício ao mesmo tempo.

Quando ficou pronto, pensei que o meu conto ficaria melhor em um livro com histórias de outras famílias. E se fossem famílias de culturas diferentes? Como é que eles chegaram aqui? À medida que a ideia se consolidava, fui pensando em amigos autores que se encaixassem no livro e, mais importante, que estivessem a fim de dar esse mergulho na história da própria família.

Se juntaram a mim André Kondo, Eliane Potiguara, Luís Eduardo Matta e Sonia Rosa. Ficou perfeito. Entre seus reconhecimentos, o livro foi escolhido para compor o projeto Mala dos Saberes Deslocados, da ACNUR (Agência da ONU para Refugiados).

Livríssimo: Em “Encontros folclóricos de Benito Folgaça”, você aborda personagens assustadores do folclore brasileiro. De que modo você conseguiu equilibrar elementos de humor e de terror neste livro?

ENCONTROS FOLCLÓRICOS DE BENITO FOLGAÇA

Alexandre: A ideia inicial do livro era trabalhar com humor. O personagem chegaria atrasado ao trabalho e cada dia daria uma desculpa diferente, sobre um encontro com um desses seres.

Mas ficou repetitivo, então decidi criar uma biografia da vida do Benito. Passagens de sua vida quando se deparou com criaturas horríveis e não lobatizadas do nosso folclore.

O humor, que já estava na ideia original, permaneceu para contrabalançar o terror. Não um humor rasgado e explícito, e sim um que viesse em doses pequenas, comedido. O terror combina com o humor fino. Dá liga e não fica ridículo ou forçado.

Livríssimo: Você chama os personagens que aparecem nesta obra de “time B do folclore” porque, comparados ao Saci, Curupira e Lobisomem, são menos conhecidos pelos brasileiros. De onde vieram suas inspirações para abordar, por exemplo, o Corpo Seco e o Capelobo (entre outros)? Você realizou muitas pesquisas para elaborar esta trama?

Alexandre: Eu sempre realizo pesquisas, ainda mais quando vou tratar de um tema que surge das narrativas populares.

Não fui eu quem colocou tromba no Capelobo, ou quem vampirizou o Corpo Seco. Essas características existem há muito tempo e são oriundas da sabedoria dos mais velhos, histórias coletadas por folcloristas como o Câmara Cascudo, entre outros. Não cabe a mim mudar o que já está estabelecido.

Fiz uma análise inicial através do Dicionário do Folclore Brasileiro, de Câmara Cascudo. Foi lá que encontrei as personagens que queria usar. A partir daí, busquei cada um em outras fontes, tentando encontrar semelhanças e divergências em sua descrição e buscando a melhor versão de cada criatura que se encaixasse no que eu queria fazer.

Livríssimo: Além de escrever em prosa, você se aventurou pela poesia em “Haicais do chefe”. Como foi desenvolver este projeto tão diferente? As ilustrações também fazem parte da experiência de leitura dos haicais, como foi a colaboração com o ilustrador Jean-Claude Alphen?

HAICAIS DO CHEFE

Alexandre: Esse livro surgiu a partir das imagens. O Jean me passou algumas ilustrações de coletivos e me pediu para colocar o texto.

Eu quis aproveitar o momento turbulento em que o Brasil estava passando, o da grande batalha política, e brincar de achar o chefe daquele coletivo, destacando no texto uma qualidade de um bom líder. Não roubar, não mentir, se colocar no lugar do povo para quem governa, etc. É falar o óbvio, eu sei. Mas em algum momento deixamos de falar, o que resultou no pior dos mundos. Espero que a mensagem fique e que os leitores reflitam em cima dela.

Quanto a fazer em haicai, foi mais um desafio. Eu tinha acabado de publicar livros de limeriques e outro com trovas. Por que não me arriscar no haicai? Afinal, o autor também se diverte, não é?

Livríssimo: Eu sou uma lagartixa” é uma celebração à criatividade infantil. Quais foram suas inspirações para ter a ideia desta trama?

EU SOU UMA LAGARTIXA!

Alexandre: Eu estava na livraria vendo alguns livros para crianças pequenas e me deparei com aquelas obras de autores estrangeiros, cujos títulos eram enormes: “A girafa que não gostava de gravata borboleta” ou “O hipopótamo que não trocava a cueca” ou algo assim. Li os livros e não achei graça. Era tudo meio bobo.

Entendo que a ideia era brincar com o inusitado, mas senti falta de uma história de fundo. Comecei a pensar em um conto de mistério para os pequenos. Talvez “A lagartixa que não conseguia subir pelas paredes”, ou algo assim. Depois mudei de ideia quanto ao título, quis dar uma pista do mistério ali. Por que ela não sobe as paredes? Oras, a resposta está clara! Ou não?

Para concluir…

Livríssimo: Que mensagem gostaria de passar para os jovens?

Alexandre: Uma mensagem bastante simples, mas que pode trazer grandes benefícios. Nós somos memórias. Memórias do que fizemos, memórias do que vamos fazer, memórias de como reagimos a determinadas situações. Quando falamos de nós mesmos, falamos baseados na nossa experiência de vida. E experiência vem de experimentar.

Portanto, desconectem-se de vez em quando! Nem que seja apenas uma vez por semana. Largue o celular de lado, esqueça o videogame e a TV. Saia de bicicleta, dê um mergulho no mar, no rio ou na piscina. Vá pescar. Experimente aquele doce diferente daquela padaria nova. Visite um museu. Assista ao show daquele cantor que você gosta. Colecione algo. Leia um livro do qual você sempre ouviu falar e ficou curioso. Leia na rede e adormeça nela. Brinque com brinquedos. Monte cenários com eles.

Crie memórias, porque quando envelhecemos, são elas que nos farão companhia. Se é para se lembrar de um pôr do sol, que não seja daquele que vimos pelo visor de um celular.

Confira também: Livríssimo entrevista: Regina Rennó

POSTS RELACIONADOS

TikTok
@livrissimo Prepare-se para uma viagem ao passado com um toque de futurismo! 🌌 Neste texto da coluna "Pega a Visão", a autora Penélope Martins nos apresenta as inovações visionárias de Júlio Verne, um dos grandes mestres da ficção científica. 📚 Confira em: https://bit.ly/3NQwYCb #Livríssimo #PegaAVisão #JúlioVerne #FicçãoCientífica #FYP ♬ som original – Livríssimo
Mais lidos
Newsletter

RECEBA POR EMAIL